domingo, 9 de abril de 2017

Poliamor e Pegação

A História se repete na vida de várias pessoas, especialmente mulheres.

Primeiro você percebe que a monogamia não é pra vc. Falta alguma coisa, houve alguma experiência, teve alguma sacação que te mudou.

Depois de um tempo perambulando pelo mundo e pela vida sem saber o que fazer com isso, vc descobre que outras pessoas também pensam assim. Elas vão se encontrar em algum lugar! Uma festa, um bar, um bloco de carnaval... e vc se empolga, junta uma grana e vai!

Lá, vc percebe que a liberdade de que vc sentiu falta uma boa parte da vida tá lá. As pessoas não têm medo de falar de sexualidade, de pegarem alguém do mesmo sexo na frente da galera – pelo contrário, pra algumas pessoas isso parece até legal! – de ficarem com mais de uma pessoa ao mesmo tempo no mesmo lugar! A galera é diferente, descolada, super receptiva – aí, mesmo q vc n se sinta uma pessoa tão descolada assim, se permite ser mais do que tem sido. Você se anima, rola um bom papo, uma troca de olhares e vc se pega com alguém – talvez com a primeira pessoa do mesmo sexo na vida! Depois disso, um mundo de possibilidades e liberdade se abrem na sua frente... vc vai mais uma vez, e outra e outra... pega várias pessoas diferentes, é tudo muito legal...!

Mas aí uma das duas coisas acontece: vc gosta especialmente de alguém (ou alguéns) e quer ter mais do que ficadas eventuais – você quer chamar pra ir no cinema, conversar da vida, ver netflix, comer pizza, deitar de conchinha com um pet dormindo do lado; ou vc simplesmente sente que aquilo ali não tá dando conta do que vc procurava de alguma forma. Em ambos os casos, vc sente que aquela coisa de pegação, no final das contas, "não deu certo". Ou deu certo por um tempo, mas o deslumbre de poder ficar com várias pessoas, por mais legais que sejam, passou. Você quer alguma outra coisa. Você quer compartilhar: momentos, angústias, companheirismo, idéias... e você percebe que não ia conseguir isso com a galera que antes parecia tão descolada. Ou talvez até consiga, mas não com a profundidade que você gostaria com as pessoas por quem vc mais se sente envolvida/envolvido/atraída/atraído.

Nessa hora, algumas pessoas voltam atrás e pensam “isso foi só uma fase, não era pra mim” e voltam a buscar um par monogâmico. Ou então você simplesmente segue frustrada/frustrado, talvez sem parceiros/parceiras.

Pois é. É nessa hora que chegou o momento de a gente falar de poliamor.

Por que, por mais que vc estivesse vivendo uma coisa não-monogâmica antes, não é isso que realmente o seu eu, lá dentro, tava procurando. Se pegar com um bocado de gente pode ser libertador pra uns e não pra outros; gostar ou não de ficar com várias pessoas não diz se vc é ou não poli. Mas é aquela sensação de que podia passar da ficação descompromissada: virar outra coisa (que você talvez não saiba o nome) sem perder a leveza, sem perder a liberdade, mas que tenha mais aquela coisa que a gente sente falta e às vezes não sabe dizer oq é... companheirismo; sentir que vc importa praquelas pessoas que vc andou pegando.

Infelizmente, muita gente poli (que às vezes nem sabe que é poli, às vezes só se denomina “não-monogâmica”) sofre com isso. Pela minha experiência, isso é consequência de algumas coisas:

Primeiro, faltam espaços polis. Se vc é do Rio de Janeiro, a Pratique Poliamor RJ organiza eventos, mas talvez vc n conheça, n saiba se vai ser legal, n tenha tido a oportunidade de ir... se vc é de outro estado, ou de uma cidade distante, talvez nem isso tem. Mas ir nesses eventos (ou organizar um deles) faz diferença. Não pq você pode encontrar outras pessoas pra “pegar” – mas por que você pode encontrar pessoas que se frustraram com a mesma coisa que você; e que estão tentando ter, na prática, tipos de relacionamento que verdadeiramente combinam com o que você também está querendo por dentro. Pode ser que você conheça uma ou mais pessoas legais e acabe tendo relacionamentos afetivos e sexuais a partir daí. Mas meu conselho é: tira o foco disso. Quando vc tiver amigos e amigas com quem você pode conversar sobre o que você sente, sobre o poliamor em si, sem medo de julgamentos, muita coisa começa a mudar e você vai se sentir mt melhor.

Segundo, falta às pessoas, no Brasil, entender melhor a responsabilidade afetiva. Todo mundo tá procurando liberdade, mas prum poli, a liberdade só não basta. Envolvimento tem que ter alguma forma. E, agir de acordo com o que você quer fazer o tempo todo, pode causar sofrimento pra um monte de gente, inclusive você. Entender que o que a outra pessoa não é responsabilidade única e exclusivamente dela, entender que você não é pior por que não se sente à vontade com as coisas que você queria encarar de boa, entender que é possível sim conversar com seus parceiros sobre o que você tá sentindo e chegar a acordos que deixam todo mundo mais à vontade, mais seguras/seguros, sem que tenha que ser uma imposição ou um constrangimento... tudo isso pode tornar a sua experiência no poliamor uma coisa mt mais libertadora em vários sentidos.

Por último, acho que a gente precisa lembrar que nem toda forma de não-monogamia é poliamor. E nem toda forma de não monogamia se importa com responsabilidade afetiva com todas as pessoas envolvidas. Em vários ambientes que envolvem gente que não necessariamente é poli mesmo, se abre espaço, por mais que seja controlado, predadores sexuais e polígamos.

Os primeiros, querem fazer sexo – não importa se vc vai querer alguma coisa depois ou não. Essas pessoas estão lá pq querem sexo fácil... e nesse caso, polis, principalmente mulheres, principalmente negras, principalmente bis, se tornam presas desse tipo de pessoa. Não que o sexo casual seja um problema, mas sim que quando não fica claro o que é cada coisa, sempre alguém vai sair machucado. E se você é poli, provavelmente a pessoa machucada vai ser você.

Os segundos parecem muito que são polis, por que dizem que querem compromisso e às vezes até dizem que “dão liberdade” pros seus parceiros/parceiras também. Mas isso é, muitas vezes, uma mentira. Polígamos nos meios não monogâmicos, quando não se dizem polígamos, estão te enganando. Estão t arrastando pruma potencial relação em que elas vão ter liberdade e vão fazer o que querem, mas você vai ficar sob controle, sendo impedida/impedido de viver seus amores – ou mesmo dar chance deles aparecerem.

Vivemos numa sociedade competitiva, em que tudo é mercadoria, em que todos são descartáveis e isso vai ser sempre uma barreira objetiva pra gente viver nossos amores. Eu acredito que precisamos de uma sociedade de tipo diferente pra podermos viver plenamente o poliamor, mas não quer dizer que pros dias de hoje tá tudo perdido.


Estou cada vez mais convencido de que o poliamor no Brasil (que ainda é muito embrionário e idealizado) precisa discutir/estudar mais a responsabilidade afetiva, se comungar mais, criar mais laços de amizade, se apoiar mais uns aos outros, estudar e, acima de tudo, se organizar. Acredito que é a serviço disso (além de outras coisas) que a Pratique Poliamor RJ existe. Eu construo ela, por que acredito nessa alternativa e quero que outros polis possam também se proteger e viver de maneira mais plena seus amores. Se vc é do Rio e não conhece a pratique, se aproxime, participe, organize com a gente! Se onde vc mora isso não existe, organize mais gente, faça encontros, mesmo que pequenininhos... precisamos uns dos outros!


Vem com a gente! :)

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